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[Coluna] O engessamento das pautas identitárias nas premiações hollywoodianas
Em 2018, os movimentos organizados por mulheres abalaram as estruturas misóginas de Hollywood. Como resultado de feminismos que vêm sendo discutidos nos últimos anos por toda a sociedade, atrizes e trabalhadoras da indústria cinematográfica norte-americana usaram seus espaços em premiações como Globo de Ouro, Sag Awards e Oscar para dar palco aos seus discursos e denúncias sobre violência de gênero e disparidade salarial no cinema.
[Coluna] Grandes produções e representatividade: como a indústria cultural tem assimilado debates atuais?
Antes de Mulher-Maravilha estrear no primeiro semestre de 2017 muitas dúvidas pairavam no ar. Como será recebido um filme de uma heroína depois do fiasco que foi Batman vs Superman diante da crítica especializada? Como será recebido um filme de grande orçamento como este, dirigido por uma mulher?
Com a estreia, algumas dessas perguntas foram respondidas. De acordo com o Hollywood Reporter, o filme registrou a maior bilheteria de um filme de live-action dirigido por mulher de todos os tempos, fez a maior bilheteria de estreia de um filme dirigido por uma mulher na América do Norte e foi o filme de herói com melhor sustentação nas bilheterias também da América do Norte em 15 anos.
Todos esses marcos transmitem um recado tanto para o público quanto para a indústria: existe sim uma demanda por filmes protagonizados por mulheres fortes, por heroínas, e também dirigidos por mulheres. Filmes que quebrem um padrão de representação narrativo e estético e que proporcionem representatividade.
É notório que esse recado começa a ser entendido agora. Há algum tempo, nomes importantes da indústria audiovisual têm se dedicado a lançar produções de algum modo voltadas a discussão de gênero, cor ou sexualidade, como é o caso da Netflix. Apesar de ser uma empresa jovem, a plataforma já investiu em séries como Sense8, Las Chicas del Cable, Cara Gente Branca, Alias Grace e Jessica Jones.
Isso significa que as empresas que estão se dedicando a repensar protagonismos e enredos são generosas e benevolentes? Não totalmente, claro. São empresas e, como tais, precisam de lucros. O maior motivo desse movimento de mudança, sem dúvidas, é a percepção por parte de quem vende o produto cultural de que existem nichos que consomem entretenimento e que reprovam o que é retrógrado.
O feminismo, por exemplo, vem sido debatido com muito mais visibilidade. Logo, cria-se um nicho de pessoas que querem filmes, livros, jogos, músicas e séries protagonizados e feitos por mulheres. O entretenimento é político e econômico assim como absolutamente tudo . Nossas escolhas são políticas e, a fim de lucrar, o capital certamente vai nos oferecer possibilidades. Não é de hoje que o capitalismo se apropria de coisas e causas.
Mulher-Maravilha nem de longe é o filme mais feminista que poderíamos ter fazendo bilheterias estrondosas. Ainda faltam heroínas negras, lésbicas, transsexuais. Faltam filmes não americanos fazendo sucesso e chegando a mais gente. Faltam narrativas plurais, distribuição de filmes e de orçamentos mais igualitária e por aí vai. .
Estamos longe de um ideal de representatividade. Não devemos ser ingênuos,tem muito trabalho a ser feito sim. Mas o fato de um filme de heroína causar esse tipo de repercussão no cinema, ou de o novo Doctor Who ser uma mulher pela primeira vez e fazer com que homens, que são representados em qualquer coisa, achem que suas experiências com a série foram destruídas porque a presença de uma mulher é muito nociva a suas masculinidades frágeis, simboliza que, de alguma forma, a indústria cultural não está imune ao esforço das militâncias.
O termo da vez é a =&0=&. Um caminho penoso, mesmo agora que não só as obras são questionadas, mas também o comportamento de quem as faz. 2017 foi o ano que levou Hollywood a se contorcer diante de suas contradições. Enquanto os três filmes de maior bilheteria foram realizados ou protagonizados por mulheres (Star Wars: Os Últimos Jedi, A Bela e a Fera e Mulher-Maravilha), muitos dos
grandes nomes da indústria foram acusados de assédio ou abuso sexual e atores famosos foram retirados das produções em que estavam envolvidos
A Hollywood de Hitler: documentário alemão expõe o cinema nazista
Você já deve ter reparado na imensa quantidade de filmes que abordam o nazismo de alguma forma, certo? O cinema se apropriou do assunto para criar filmes que vão desde aventuras, em que os vilões são os nazistas, como é o caso de Indiana Jones: Os Caçadores da Arca Perdida (1981), passando pelo emocionante drama O Menino do Pijama Listrado (2008), até o clássico A Lista de Schindler (1993).
Mas, o que raramente reparamos é que, pelo fato do cinema ser essencialmente político, assim como qualquer outra arte, sua relação com o regime totalitarista alemão – responsável por um dos maiores genocídios da humanidade – também não deixa de ser política. Há algum tempo, os nazistas são vistos como vilões pelo cinema, e histórias emocionantes falam sobre as vítimas daquele sistema. Mas nem sempre foi assim.
O documentário alemão =&0=&(2017) mostra como a sétima arte foi usada pelo regime nazista, como ferramenta de propaganda partidária e de alienação de massas. De acordo com a obra, ao longo do Terceiro Reich (entre 1933 e 1945) foram feitos aproximadamente mil filmes. Cerca de 300 deles eram melodramas, muitos eram musicais e operetas, outros eram histórias de detetives e investigações. Mas, todos possuíam algo em comum: suas narrativas tinham o propósito de passar mensagens sutis de obediência, subserviência e adoração ao Partido; além de justificar o controle, a vigilância e o ódio como formas de proteção contra os “inimigos do sistema”. Esses filmes eram vendidos como “apolíticos”, mas, na verdade, foram tão politizados que, hoje, nos fornecem registros de uma sociedade fundada na ignorância.
Durante o período de pouco mais de dez anos do Terceiro Reich, o cinema autoral foi tragado. Cinema era sinônimo de propaganda do Partido Nazista e Joseph Goebbels – Ministro da Propaganda da Alemanha Nazista – se tornou basicamente o único cineasta da nação. Ele era responsável por fiscalizar ou criar argumentos e roteiros, e tudo passava por sua supervisão. Em consequência disso, muitos dos cineastas alemães fugiram e se exilaram. Os que ficaram, tiveram de se adaptar à narrativa do Partido ou passaram a fazer filmes tão independentes que passavam despercebidos pela censura. =&1=&
As mensagens propagadas pelo cinema falavam sobre como a nação alemã e nazista era feliz e realizada, como a qualidade de vida era incrível, como os jovens não deveriam aderir ao estilo de comportamento da juventude comunista e “sem pudores”, e como era necessário servir ao país. Mas, nem sempre essas mensagens eram escrachadas. Os filmes cumpriam a função de transmitir padrões ideológicos e de comportamentos sutilmente, mesmo que nunca de forma inofensiva. Isso se deu, em boa parte, graças ao Star System (Sistema de Estrelas) e ao melodrama, que, juntos, possibilitaram o sucesso das engrenagens da máquina de propaganda.
Assim como Hollywood, o cinema alemão nazista produziu estrelas de cinema que foram adoradas pelo público e serviram como exemplo de estilo de vida (Star System). Somada à influência das estrelas de cinema, o melodrama também foi utilizado amplamente – por se tratar de um recurso eficaz em internalizar emoções e irracionalidades. Dessa forma, uma narrativa, a princípio simples, foi capaz de transmitir o recado com eficiência.
Além disso, a indústria cinematográfica alemã se adaptou à demanda do público, de acordo com o contexto social da época. Durante a Segunda Guerra Mundial, por exemplo, os filmes tinham que agradar as mulheres – levando em conta que a maioria dos homens estavam nas batalhas. O documentário mostra que, durante esse período, até existiram alguns filmes protagonizados por mulheres “fortes”, mas sempre até certo ponto. No fim, o conservadorismo vencia e sugeria às mulheres, sutilmente, que “se comportassem”, como era o esperado. Isso, sem falar dos padrões de beleza estabelecidos por causa das grandes estrelas.
Esse comportamento das produções nazistas indica que, assim como o capitalismo, regimes totalitários podem se apropriar de demandas de minorias – como o feminismo –, para exercer seu domínio. Nesse caso, as atrizes e suas personagens faziam parte desse mecanismo de apropriação. Daí a importância de estarmos sempre atentos aos movimentos do mercado e do marketing – o filme Lída Baarová (2016), biografia da atriz checa que, durante a Segunda Guerra Mundial, se tornou amante do ministro Goebbels e foi convidada para trabalhar no cinema alemão, está disponível na Netflix. A partir dele, é possível ter uma noção de como funcionava o sistema de estrelas.
É importante ter em mente que o cinema “diversão”, baseado em entreter com celebridades e melodramas, foi um dos grandes feitos do nazismo, porque, supostamente apolítico e inofensivo, conseguiu se converter em uma arma ideológica tão forte, que chegou a afetar até mesmo a própria Hollywood. Segundo pesquisas contidas no livro
A colaboração – O pacto entre Hollywood e o nazismo
Quem são as cinco mulheres indicadas por direção na história do Oscar
Isso significa que selecionar a quinta mulher indicada por direção (Greta Gerwig, por Lady Bird – A Hora de Voar), excluir um ator de uma das categorias principais (James Franco perdeu sua suposta indicação à Melhor Ator, por Artista do Desastre), nomear outro que ocupou o papel de um artista acusado de assédio (Chistropher Plummer substituiu Kevin Spacey em Todo o Dinheiro do Mundo, após o segundo ter tido suas cenas retiradas do filme), e indicar a primeira mulher na categoria de Fotografia (Rachel Moririson, por Mudbound – Lágrimas sobre o Mississipi), indica a evolução irrevogável da equidade de gênero na indústria cinematográfica estadunidense. Pensando nisso, confira abaixo a lista das únicas mulheres já indicadas ao Oscar de Melhor Direção:
1. Lina Wertmüller, por Pasqualino Sete Belezas, em 1977
Coluna: Como a depressão de BoJack Horseman me fez enxergar a minha própria
Time’s Up – O senso comum só se incomoda com o assédio sazonalmente
A CARTA NO LE MONDE
No último dia 9, dois dias após o Globo de Ouro, cem artistas e intelectuais francesas assinaram uma carta no jornal Le Monde, criticando o suposto “excesso de zelo” dirigido à questão do assédio durante a cerimônia. Entre as assinantes, está a atriz Catherine Deneuve (A Bela da Tarde / Os Guarda-Chuvas do Amor), de 74 anos, uma das personalidades francesas mais conhecidas no mundo. No manifesto, está evidenciado um dos motivos pelos quais tantas vítimas de abusos sexuais de diversos lugares do globo não denunciam os chamados “predadores sexuais“: a dificuldade do senso comum em aceitar a diferença entre assédio e paquera. Vamos, portanto, deixar clara, aqui, tal diferença.
Segundo o dicionário Aurélio, assédio é o “ato ou efeito de assediar; (…) comportamento desagradável ou incômodo a que alguém é sujeito repetidamente; (…)”, enquanto que assédio sexual é tido como o “conjunto de atos ou ditos com intenções sexuais, geralmente levado a cabo por alguém que se encontra em posição hierárquica, social, econômica, etc.”. Sendo assim, quando uma pessoa se sente incomodada com as investidas sexuais de uma outra, cujas intenções e ações foram desmedidas – e com o propósito único de estabelecer certo domínio sobre o corpo da primeira –, o incômodo em questão é consequência direta de um ato assedioso.
(Abaixo, vídeo divulgado na página pessoal do Instagram da atriz Brie Larson, a respeito da campanha Time’s Up no Globo de Ouro):
Crítica: Liga da Justiça
Quando a Warner Bros. confirmou a produção de Liga da Justiça e de todo o universo cinematográfico da DC Comics, os fãs foram à loucura. Mas, sob suas cabeças, pairou a dúvida de que a DC seria mesmo capaz de transformar suas histórias tão bem quanto a concorrente Marvel.
Em 2012, Os Vingadores foi um verdadeiro sucesso de crítica e de bilheteria. Daí em diante, a Walt Disney Pictures catapultou a popularidade de seus filmes de super-heróis, trazendo, quase que com unanimidade de público, uma alta qualidade ao Universo Marvel. Quanto à DC, em 2013, com o lançamento de O Homem de Aço – o primeiro filme de Henry Cavill como Superman –, a Warner viu-se bem atrás de sua rival, tanto para a crítica especializada quanto para o público.
A rixa entre Marvel e DC intensificou-se à medida em que os polêmicos filmes desta última eram lançados no cinema. Batman vs Superman: A Origem da Justiça (2016) conseguiu atingir níveis satisfatórios de bilheteria, mas a crítica apresentou baixa aprovação. O filme tem uma vasta lista de problemas e sua má execução é inegável. Já o seguinte Esquadrão Suicida consegue ser ainda pior.
Neste ano, com Mulher-Maravilha, a DC finalmente nos entregou um longa-metragem digno de apreço. Sendo assim, as expectativas para Liga da Justiça aumentaram um pouco, mas não o suficiente para esquecer os fracassos antecessores da empresa. Zack Snyder retorna na direção do primeiro filme da Liga. Batman (Ben Affleck), Mulher-Maravilha (Gal Gadot), Aquaman (Jason Momoa), Flash (Ezra Miller) e Cyborg (Ray Fisher) reúnem-se para evitar que um poderoso inimigo ataque o planeta.
Em primeiro lugar, apesar de todos os pesares, e considerando a baixa média de aprovação da crítica, Liga da Justiça é um bom filme. Ele é supreendentemente divertido e apresenta um enredo amarrado. A harmonia entre os integrantes do grupo é inegável e todos os atores entregam boas atuações.
A cena de introdução traz um Batman bastante amadurecido, lutando em um cenário “a la Gotham de Tim Burton”. Em seguida, há uma espécie de clipe musical, construído a partir das técnicas mais usadas por Snyder – como câmera lenta e explosões –, e uma sequência fantástica da Mulher-Maravilha em ação. As primeiras cenas do filme já trazem um clima bem diferente do de Batman vs Superman. Está claro que a produção quis mostrar que aprendeu com as reprovações anteriores e inovou em seu estilo; principalmente através da fotografia mais colorida que a DC adotou em seus dois últimos filmes. E, o mais importante, é que isso tudo funciona.
Ezra Miller é o principal alívio cômico do longa. Sua atuação competente não transforma Barry Allen (o Flash) em alguém cansativo, mas sim carismático e até mesmo ingênuo. O Aquaman de Jason Momoa é basicamente o integrante mais descolado da Liga. Protagonizando cenas na inédita Atlantis, embaixo d’água, temos um vislumbre de como será seu filme solo. Quanto ao Cyborg, sua trama individual é, talvez, a menos explorada, mas não o suficiente para o personagem passar despercebido ou ter sua forte personalidade diminuída.
O filme sofre com a falta de representatividade feminina, mesmo com uma sequência fenomenal das Amazonas em Themyscira, e já que Diana Prince é a única integrante mulher da Liga. Além disso, um dos problemas do longa está na rápida resolução do ato final, o que deu um tom simplista demais à história.
No mais, Liga da Justiça guarda surpresas agradáveis – e a maior delas é justamente a qualidade do filme. Não há enrolação e nem muitas pontas soltas, como há em exaustão em Batman vs Superman. Liga se propõe a ser exatamente aquilo que um filme de super-heróis é: uma série de efeitos especiais de última geração, com personagens carismáticos e uma boa narração. Aguardemos os próximos longas da DC, e que eles não percam a qualidade adotada recentemente.
*Texto originalmente publicado em 23/11/17
Ficha técnica
Ano: 2017
Duração: 2h
Direção: Zack Snyder
Elenco: Gal Gadot, Ben Affleck, Ezra Miller, Jason Momoa, Ray Fisher
Distribuidora: Warner Bros
País: EUA