Ya No Estoy Aquí: De Monterrey ao Queens

Depois de passar por diversos festivais, como o de Tribeca, em Nova York, e o Morelia Film Festival, o longa mexicano Ya No Estoy Aquí estreia comercialmente direto na Netflix. Na trama, Ulises (Juan Daniel Garcia Treviño), de 17 anos, é o líder dos Terkos (obstinados), um grupo de jovens apaixonados pelo ritmo cúmbia. Juntos, eles dançam pela zona urbana de Monterrey, nordeste do México, inseridos no contexto  da “Kolombia”;  movimento contracultural que surgiu na região e reúne adolescentes em torno da música típica colombiana.

Por um mal entendido com as lideranças de um dos cartéis locais, porém, o rapaz é obrigado a deixar para trás o México, a família, os Terkos e a dança. Seu destino é o Queens, em Nova York.

‘Ya no estoy aquí’/ Divulgação

DESLOCAMENTOS 

Nos EUA como imigrante ilegal, Ulises tenta tudo que pode para se adaptar, mas o afastamento de sua comunidade o faz pensar que seria melhor voltar e encarar o perigo em vez de enfrentar a solidão de ser o outro num lugar desconhecido. Não que a vida em Monterrey fosse perfeita, todavia parece pior não estar em casa, não conseguir se comunicar com seu idioma e gírias,  não se identificar com ninguém – mesmo no Queens, onde há grande quantidade de imigrantes e manifestações culturais diversas.

Com enorme sensibilidade, o diretor e roteirista Fernando Frías trabalha com o tempo e a não linearidade clássica a seu favor para traçar um registro impressionantemente realista e rico em nuances sobre as configurações sociais de Monterrey e Queens – dois lugares que, embora cheios de particularidades, são resultado das contradições que atingem a população latina em todo o continente. 

Para Ulises, a cúmbia não é só música, dança ou estética de cabelos e roupas; é identidade, pertencimento. Da mesma forma, ser imigrante latino nos EUA não é uma condição homogênea. Nesse sentido, o filme dá conta de movimentar-se por entre diversas variáveis.

Imagem: divulgação

JUVENTUDE

Quando os Terkos deixam de dançar juntos a “cumbia rebajada” (uma versão que reproduz o ritmo em tons mais baixos e lentos) por conta da partida de seu líder, tudo muda. É a partir daí que Frías instrumentaliza a narrativa central de Ulises para falar daquela juventude. Sem o grupo e a cúmbia, resta aos adolescentes a frustração, o crime organizado, as igrejas neopentecostais, a morte.

Assim, a história do mexicano que emigra para os EUA, fugindo da violência ou da miséria, recorrente no cinema, serve em Ya No Estoy Aquí como pretexto para um olhar singular sobre o México; além de expandir as discussões sobre migração, já que o deslocamento do protagonista vem, afortunadamente, acompanhado de atentas e cuidadosas observações sobre sociedade, arte e subjetividades. E ainda que o filme pareça melancólico, trata-se de um registro extremamente visual, autêntico e envolvente de determinado contexto que extrapola estereótipos. Temos, portanto, o que pode ser considerado um dos melhores lançamentos da Netflix em 2020.

Imagem: divulgação

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Ficha Técnica:

Direção: Fernando Frías

Duração: 1h52

País: México

Ano: 2019

Elenco: Juan Daniel Garcia Treviño, Coral Puente, Angelina Chen, Jonathan Espinoza

Gênero: Drama

Distribuição: Netflix

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